Pressionado pela crise, governo vê Centrão longe, sofre críticas e muda slogan em teste para 2026

Pressionado pela crise, governo vê Centrão longe, sofre críticas e muda slogan em teste para 2026
Foto: reprodução

Por redação com O Globo


Sob pressão crescente pela crise com o Congresso em torno do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o governo vê o Centrão se distanciar e impactar tanto a governabilidade quanto as pretensões para uma aliança em torno de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para 2026. Em uma tentativa de mudar o foco, o Palácio do Planalto decidiu aposentar o slogan “União e Reconstrução”, marca da transição pós-governo de Jair Bolsonaro, e apostar em uma mensagem que trate de “justiça social”. A troca contempla a linha do que Lula e ministros como Fernando Haddad (Fazenda) têm vocalizado nas últimas semanas e também busca já testar o discurso que será usado na busca por um quarto mandato do petista.


Executivo e Legislativo enfrentam uma relação de altos e baixos desde o início do mandato, mas o momento atual da turbulência abriu novos flancos para a gestão, e a decisão de judicializar a derrota imposta pelo Congresso na votação sobre o IOF aprofundou o mal-estar (leia mais na página 19). Dentro desse contexto, dirigentes do PP aumentaram a pressão pela saída do ministro do Esporte, André Fufuca, vice-presidente da sigla e deputado licenciado.


Outros partidos se mexem


O PP já tinha dado um passo rumo ao afastamento quando formou uma federação com o União Brasil, legenda que indicou três ministros, mas cujo comando passou a dar sinais de distanciamento do governo. A nova configuração partidária levará a uma bancada de 112 deputados, a maior da Câmara, e 14 senadores, a maior do Senado ao lado de PL e PSD.


A movimentação indica um realinhamento pensando em 2026. Dirigentes da federação manifestaram que vão trabalhar pelo apoio a um nome da centro-direita. Aliados de Lula já contam com a defecção e buscam lideranças desses partidos que possam dar apoios pontuais nos estados ao projeto de reeleição.


"Vamos discutir isso (saída do Progressistas do governo) em agosto, depois das convenções partidárias", afirmou o presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), sobre o encontro em que o partido vai oficializar a aliança com o União.


Além de Fufuca, dirigentes do PP participaram, junto com outras legendas do Centrão, da indicação do presidente da Caixa, Carlos Vieira. Líderes do PP dizem que o ministro do Esporte já foi avisado sobre o crescente descontentamento na bancada com a sua permanência na gestão petista. Aliados, no entanto, negam que haja qualquer tratativa sobre sua saída e dizem que ele não foi procurado oficialmente para discutir o assunto. Procurado, Fufuca não se manifestou.


As conversas internas no PP estão em consonância com o movimento de outros partidos do Centrão. O União Brasil vem adotando postura semelhante, mas dirigentes afirmam que a tendência é que o partido, mesmo que oficialize o desembarque, não puna filiados que desejem estar com Lula, o que abre espaço para casos pontuais de permanência. A sigla indicou três ministros: Celso Sabino, do Turismo; Waldez Góes, da Integração Regional; e Frederico Siqueira Filho, das Comunicações.


Uma possibilidade para o União é a candidatura do governador de Goiás, Ronaldo Caiado. Outra hipótese, que também pode incluir PP e Republicanos, é uma possível aliança com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), cujo grupo trabalha com os nomes do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ou um membro da família Bolsonaro para liderar a chapa.


Neste cenário, a federação PP-União já vislumbra ocupar a vice na chapa.


No caso do Republicanos, à frente do Ministério de Portos e Aeroportos com Silvio Costa Filho, os sinais de afastamento do governo Lula são semelhantes.

"Sempre fomos independentes. A entrada dele (Silvio Costa Filho) foi pessoal", disse Marcos Pereira, presidente da legenda.


Diante desse clima hostil, a troca de slogan, que vinha sendo discutida internamente há semanas, ganhou força. O novo mote já vem sendo testado em discursos do presidente e está alinhado com a mudança de tom na comunicação do presidente e seus ministros.


A avaliação no Planalto é que o esgotamento da narrativa de conciliação exige uma resposta mais enfática aos posicionamentos da oposição e às derrotas no Congresso. O objetivo agora é reposicionar o governo em torno de pautas populares, com foco na melhoria da renda e na redução da desigualdade. A iniciativa também tem cunho eleitoral, e as novas mensagens já servirão como teste para o enredo que será apresentado em 2026, quando o presidente Lula provavelmente concorrerá à reeleição.


A ideia da gestão Lula é abandonar o tom pacificador do “União e Reconstrução”, adotado após os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, e assumir uma postura mais combativa, voltada para temas de forte apelo popular, como justiça fiscal, taxação de grandes fortunas e isenção do Imposto de Renda para a classe média assalariada.


Assim, a gestão petista direcionou a mira para o aumento da tributação dos mais ricos e no discurso de que essa mudança beneficia a parcela mais pobre da população. Desde a semana passada, o presidente tem abordado esses temas com mais afinco. Em agenda no Tocantins, chegou afirmar que “não gostam dele por causa do projeto que aumenta o IR para os mais ricos”


Críticos no Congresso veem a volta do discurso do “nós contra eles” e reclamam que o governo analisa as contas públicas apenas sob a ótica do aumento da arrecadação e não apresenta medidas estruturais voltadas ao corte de gastos.


Segundo interlocutores próximos de Lula, a nova marca tem como objetivo resgatar o espírito da campanha de 2022 e reconectar o presidente com suas bases sociais mais fiéis. A leitura é de que o ambiente político exige um reposicionamento claro, frente à queda nos índices de aprovação.


De acordo com a última pesquisa Quaest, divulgada no início de junho, a desaprovação ao governo Lula alcançou 57%.


"Quando a gente coloca que as pessoas que ganham mais de meio milhão paguem um pouco mais, gera uma rebelião", disse Lula na terça-feira no evento de lançamento do Plano Safra, em referência ao projeto do governo que isenta de Imposto de Renda quem ganha até R$ 5 mil e eleva a taxação da parcela mais rica.


Agro reclama


Em paralelo, parlamentares da base governista e a ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) estão atuando para tentar distensionar a relação com o Congresso. Na terça-feira, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse que conversou com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) sobre as prioridades do Executivo na Casa até o fim do ano. Segundo o deputado, Motta mostrou “disposição em votar matérias de interesse do país”.


Enquanto enfrenta desgastes com partidos que têm ministérios, o Planalto também viu aumentar a tensão com a bancada do agronegócio. Parlamentares reclamaram que foram convidados em cima da hora para o lançamento do Plano Safra na terça-feira, o que o o governo nega. Os congressistas do grupo, no entanto, não apareceram no evento organizado para anunciar créditos para o setor agrícola.


"Eu quero esclarecer e refutar categoricamente que o governo federal esteja patrocinando o agronegócio brasileiro. Tudo que foi dito nesse evento de lançamento foi completamente equivocado", afirmou presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Pedro Lupion (PP-PR).